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O IRN Está a Falhar — E O País Não Pode Fingir Que Não Vê

Há situações em que o silêncio administrativo ultrapassa a esfera burocrática e se transforma em algo mais grave: uma violação institucional. É exatamente isso que está a acontecer com o Instituto dos Registos e do Notariado (IRN).O problema deixou de ser um atraso pontual — tornou-se um colapso previsível, prolongado e, pior ainda, normalizado.

Durante anos, o IRN acumulou processos, ignorou prazos legais e permitiu que a máquina pública se tornasse um labirinto onde cidadãos esperam indefinidamente por uma decisão que deveria ser simples.Hoje, o cenário é inaceitável: há processos com três ou quatro anos de espera, sem qualquer resposta. E a pergunta que precisa ser feita, com todas as letras, é: como chegamos a isto?


Não é falha operacional. É falha de gestão.

É fácil culpar a alta procura, os estrangeiros, a “falta de pessoal”, ou a burocracia tradicional.Mas essa explicação já não convence.O que vemos é um organismo que, ano após ano, não se moderniza, não se reorganiza, não se adapta e não responde.

O Estado não pode gerir um fluxo de pedidos desta dimensão com estruturas do século passado.Não pode continuar a atuar como se decisões de nacionalidade fossem favores.São direitos. E quando direitos são ignorados, a democracia perde parte da sua credibilidade.


A demora do IRN fere princípios constitucionais

Quando um processo ultrapassa 12 meses sem decisão, estamos perante uma violação jurídica clara.Quando ultrapassa 24 meses, o absurdo transforma-se em rotina.E quando chega aos 36 ou 48 meses, o caso abandona a esfera da ineficiência e entra na esfera da negligência institucional.

O artigo 268.º da Constituição é explícito: o cidadão tem direito a uma decisão administrativa em prazo razoável.O que está a acontecer atualmente não se enquadra em nenhum conceito de razoabilidade.É desrespeito.É omissão.É uma ferida aberta no Estado de Direito.


O preço da demora é humano — e devastador

Enquanto o IRN se perde nos seus próprios atrasos, vidas ficam suspensas:

  • Famílias impedidas de reunir-se

  • Profissionais barrados em oportunidades

  • Estudantes que perdem bolsas

  • Pessoas idosas que aguardam a confirmação das suas raízes

  • Trabalhadores que não podem regularizar-se plenamente

Não estamos a falar de processos; estamos a falar de pessoas.E um país que não prioriza as pessoas perde mais do que eficiência — perde humanidade.


O caminho judicial não deveria ser a regra — mas tornou-se a salvação

É sintomático que milhares de requerentes estejam a recorrer aos tribunais para obrigar o IRN a fazer o mínimo: decidir.

A ação por omissão administrativa — prevista no CPTA — foi criada como última ratio.Hoje, tornou-se o único mecanismo eficaz para acelerar processos que o Estado abandonou.

E essa realidade deveria envergonhar qualquer instituição pública séria.


Portugal precisa admitir: temos um problema estrutural

Enquanto não existir:

✔ modernização profunda✔ reforço real de pessoal✔ digitalização funcional✔ gestão orientada a resultados✔ transparência nos prazos

…continuaremos a assistir à mesma tragédia administrativa.

O IRN não pode continuar a esconder-se atrás da estatística.Não pode tratar cidadãos como números.Não pode normalizar o inaceitável.


O tempo de esperar acabou

Portugal tem vocação para ser uma nação de portas abertas, de oportunidades, de inclusão.Mas essa vocação depende de um sistema justo, eficiente e digno.

A nacionalidade portuguesa não é um presente do Estado:é um direito assegurado por lei.

E direitos não podem ficar soterrados em filas invisíveis, plataformas inoperantes ou anos de silêncio institucional.

É hora de o IRN — e o Governo — reconhecerem a gravidade do problema e devolverem ao cidadão aquilo que jamais deveria ter sido perdido: o respeito pelo tempo e pela dignidade das pessoas.

Até lá, continuarei a defender cada cliente no único lugar onde ainda se encontra resposta: o Tribunal.

 
 
 

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